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Opinião

O Brasil corre o sério risco de ser deixado para trás

Por Oliver Stuenkel*

Bolsonaro pode tornar o líder de maior impacto em nossa geração, e o Brasil pode pagar um preço bem maior do que muitos acreditam por um presidente incapaz de liderar em meio à pandemia.

A pandemia é uma ocorrência raríssima, que provavelmente moldará nossa geração mais do que qualquer outro evento, e as decisões tomadas por líderes nacionais nos próximos anos, em um mundo em fluxo, terão consequências em longo prazo não apenas para suas nações, mas também para a comunidade internacional

Como Janan Ganesh, do FT, argumentou em uma coluna recente, é provável que o próximo presidente dos EUA tenha a oportunidade de definir os fundamentos da era pós-pandemia.

Da mesma maneira, as decisões do presidente americano Truman, depois da Segunda Guerra Mundial, moldaram a ordem global e a política externa dos EUA por décadas.

O mesmo provavelmente se aplica aos líderes de nações menores, haja vista o quanto o mundo parecerá profundamente diferente após a pandemia. Por exemplo, James Crabtree recentemente argumentou que todo o conceito de Mercados Emergentes pode deixar de existir

Segundo a ONU, o desenvolvimento humano global – medida combinada dos níveis mundiais de educação, saúde e padrão de vida – pode retroceder neste ano pela primeira vez desde que o conceito foi desenvolvido, em 1990.

Se presumirmos que as escolhas feitas agora podem definir o contexto no qual futuros governos operarão, os países que atualmente têm líderes inteligentes serão recompensados ​​desproporcionalmente - simplesmente porque, devido ao contexto histórico, suas lideranças terão maior impacto.

Mesmo em países menores, líderes que respondem adequadamente à crise serão cruciais, pois as sociedades precisarão determinar como se adaptar à nova realidade nas áreas de política de saúde, emprego, transporte, educação etc., que serão todas impactados massivamente pela COVID -19

Países que atualmente têm maus líderes, por outro lado, podem acabar sendo punidos mais do que em circunstâncias normais. Além de gerir mal a crise, eles deixarão de estabelecer as bases necessárias para iniciar a (provavelmente dolorosa) adaptação de longo prazo.

No Brasil, por exemplo, Bolsonaro pode se tornar um líder que trará ao país consequências altamente negativas. Ele se recusa a aceitar evidências científicas, tornando impossível uma resposta ágil a futuras ondas de COVID-19 e outras possíveis pandemias nos próximos anos.

Potencialmente ainda pior, ele exclui o Brasil do debate global sobre um mundo pós-COVID e representa um enorme obstáculo para enfrentar os numerosos desafios que o país (junto com o resto do mundo) enfrentará nas áreas mencionadas acima.

Enquanto outros governos estão olhando para o futuro, cooperando com outros países, promovendo debates sobre questões como a Renda Básica Universal e preparando escolas públicas para futuras pandemias, o Brasil corre o sério risco de ser deixado para trás.

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*Professor de Relações Internacionais da FGV em São Paulo. Autor de 'Mundo Pós-Ocidental' / 'O Mundo Pós-Ocidental'. Colunista do EL PAÍS & Americas Quarterly