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Opinião

O novo ‘normal’ das campanhas eleitorais

Por Chico Cavalcante*

Esta semana dei uma entrevista ao Diário do Pará sobre as campanhas eleitorais em tempos de pandemia. Foi uma oportunidade de sintetizar o que penso sobre esse tema, que ainda tira o sono de muitos pré-candidatos ao pleito de 2020, e que reproduzo aqui neste espaço.

O candidato que não estiver sintonizado nos canais alternativos aos tradicionais estará fadado ao fracasso nas urnas? Isso é válido para o interior, por exemplo?

A sintonia nos canais alternativos é uma exigência tecnológica do momento, mas ela em si não basta. É preciso ficar atento a todas as formas de contato disponíveis nas mídias. No Pará, temos um perfil socioeconômico que limita o acesso à banda larga e o tempo de permanência online e ainda vivenciamos uma presença muito forte, no interior do estado, de mídias tradicionais como o rádio, cujo alcance é inquestionável. A maioria dos aparelhos de celular são pré-pagos. Isso exige que a presença online seja combinada com outras ferramentas. A televisão, por exemplo, segue tendo peso, por ser o meio de maior cobertura e maior impacto no país.

Estamos atravessando uma pandemia, em que comícios e caminhadas repletas de pessoas estarão, em teoria, proibidas. Restam aos candidatos e seus staffs as mídias sociais. Devem entrar em cena somente as lives ou você acredita que tem gente criando novidades nesse sentido?

Comícios e caminhadas são atos cênicos. Ninguém ganha votos caminhando no sol e acenando aos eleitores ou mesmo fazendo um discurso em comícios, distantes dezenas de metros do eleitor. O objetivo desses espetáculos é, desde sempre, gerar imagens que possam ser replicadas nas mídias, multiplicando o efeito de pertencimento que grandes multidões exercem sobre os espectadores - porque somente na massa as pessoas libertam-se do temor primitivo do contato. O desafio que a pandemia adiciona aqui é encontrar formas de substituir comícios e caminhadas por atos com o mesmo impacto cênico, feitos em estúdio ou ambientes fechados, por exemplo.

No geral, quais as estratégias que poderão ser tomadas para compensar a imposição do distanciamento social, para além da internet?

Candidatos discursarão e se encontrarão com lideranças comunitárias e personalidades em lives, "livemícios", para usar um neologismo. Reunirão seu público em assembleias e encontros virtuais e debaterão programa de governo em lives temáticas. O cabo eleitoral ou o militante terá um novo papel, movimentando seus contatos em aplicativos de mensagens e redes sociais. O custo de marketing, produção de TV e digital deve aumentar, enquanto diminuirá o investimento em logística de campanha.

Qual é o cenário trabalhado pelos partidos trabalham agora, nesse momento? O de que vai ter campanha na rua ou de que será mesmo tudo virtual?

As eleições serão digitais em essência e monotemáticas em narrativa, com um foco maior nas ações de saúde, cuja atenção aumentou com o medo produzido pela pandemia, e geração de trabalho e renda, devido à tragédia econômica do desemprego que emergiu agora. Claro que algumas visitas presenciais de candidatos acontecerão sim, mas com uma estrutura menor, evitando colocar o candidato e os eleitores em risco. As carreatas e o carro som voltarão com força. A campanha vai ser muito mais ativa, presente, e em um volume muito maior, mas será majoritariamente midiática.

Teremos comitê físico ou o preparo é mesmo cada um na sua casa? Qual o legado que acreditas que essa eleição vai deixar? Acreditas que regras e outras determinações possam ser ajustadas ou alteradas pelo TSE mais à frente?

Haverá sim comitês físicos, mas em número e estrutura menores que no passado, onde esses locais refletiam o frenesi da campanha. Em todas as cidades onde atuaremos vamos investir na criação de comitês virtuais para segmentar a campanha por microrregião ou mesmo por temas de interesse. A ideia é que isso substitua, na medida do possível, o corpo a corpo, dando lugar a um formato mais ágil e mais barato de acesso ao eleitor.

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*Chico Cavalcante é diretor de criação da Agência Vanguarda e CEO da Politik Lab, agência especializada em marketing político. Integrou a coordenação de marketing da campanha de Hélder Barbalho ao governo do Pará em 2018.